Passe-Livre é o aperfeiçoamento do sistema público, é um avanço da cidadania

O Passe-Livre faria com que milhões de reais anuais permanecessem circulando em Botucatu.

por Érick Facioli*

Todo ser humano, em função do que pensa ou verbaliza como opinião pessoal diante de algo, acaba sempre por traduzir, nas mais diversas relações com as quais se depara na vida, um comportamento político, não necessariamente partidário. Toda relação, com o próximo ou com algo do ambiente, é sempre uma relação política manifestada. 

Erick Facioli é jornalista, professor universitário, especialista em Gestão de Cidades, mestrando em Saúde Coletiva

Erick Facioli é jornalista, professor universitário, especialista em Gestão de Cidades, mestrando em Saúde Coletiva

O diálogo, o desejo ou busca de satisfação de alguma necessidade no universo do sistema, da sociedade, converte-se, assim, num posicionamento – de cunho político e, por extensão, ideológico, também, já que reflete o sistema de crenças da pessoa. Posto isso, cada um, numa hipotética classificação, sempre estará ou à direita ou à esquerda da régua ideológica, especialmente se vier a se manifestar em termos políticos-partidários frente a alguma temática.

As ideologias de “esquerda” ou de “direita”, conforme explica o site www.vestibular.uol.com.br, têm por origem as assembléias francesas do século 18. A intenção era reduzir, com o apoio da população mais pobre, os poderes da nobreza e do clero. Com a Assembléia Nacional Constituinte montada para criar a nova Constituição, as camadas mais ricas não se misturavam, sentando-se do lado direito. Assim, o lado esquerdo foi associado à luta pelos direitos dos trabalhadores, e o direito, ao conservadorismo e à elite.

Dentro dessa visão, passou-se denominar de esquerda, aqueles que lutam pelos direitos dos trabalhadores e da população mais pobre, aqueles que defendem o bem estar coletivo, a participação popular, os movimentos sociais e as minorias. Já a direita representaria uma visão mais conservadora, ligada a um comportamento tradicional, que busca manter o poder da elite e promover o bem estar individual.

Para o filósofo político Noberto Bobbio, embora os dois lados – direita e esquerda – realizem reformas, “uma diferença seria que a esquerda busca promover a justiça social enquanto a direita trabalha pela liberdade individual.”

Em termos políticos e ideológicos, me coloco – e sempre me colocarei – do lado da Democracia, sem confronto, porém à esquerda da régua ideológica.

É a maneira pela qual, entendo, se pode consolidar a cidadania e a partir daí avançar ainda mais, ampliando direitos individuais e coletivos, sempre no intuito de diminuir as desigualdades. Assim, temos a chance de construir uma sociedade mais justa, solidária e fraterna, até porque todos pagam impostos, de algum modo, em alguma medida, os quais devem ser revertidos para atendimento de necessidades sociais e obras de infraestrutura – e no frigir dos ovos, as camadas mais pobres da população acabam sendo as mais penalizadas pela força dos tributos.

Por conta de uma visão de esquerda da realidade, porém dentro de uma lógica inevitável próxima a social-democracia, entendo que cabe ao Estado garantir a universalidade de certos serviços básicos à população – públicos, gratuitos e de boa qualidade –, que lhe é de direito, como saúde e educação, sem, no entanto, subtrair da iniciativa privada seu direito de atuar dentro do sistema.

Também nessa linha, encontra-se o transporte público, como um direito do cidadão à sua gratuidade. Por isso, defendemos a realização de estudos detalhados visando a criação de condições e de alternativas para a implantação do Passe-Livre no transporte coletivo em Botucatu. Trata-se de um direito inalienável do cidadão, pois se a saúde é pública e gratuita, se a educação é pública e gratuita, ainda que se precise avançar muito nessas áreas, por que o transporte coletivo municipal, que é público, também não pode ser gratuito, como ocorre já em vários municípios?

Defendo essa ideia como um objetivo que pode ser alcançado pelo Poder Público, havendo criatividade e boa vontade. E se for o caso, começando antes, num primeiro momento, por uma política de subsidios para diminuir significativamente o custo da passagem.

Além de beneficiar diretamente o usuário, preservando em alguma medida o poder aquisitivo de seus rendimentos, o Passe-Livre também é uma vantagem para o empreendedor, notadamente os pequenos e médios empresários que ficariam desobrigados do vale-transporte. Sem falar dos ganhos ambientais provocados pelo estímulo ao uso em maior escala do transporte coletivo urbano.

O Passe-Livre faria com que milhões de reais anuais permanecessem circulando em Botucatu. Atualmente, esses valores acabam deixando nossas divisas na forma de concentração de renda a favor das empresas que exploram esse serviço. A proposta beneficiaria o comércio, a economia local e a população em geral, já que todo esse montante seria movimentado aqui mesmo em nossa cidade.

Como se vê, o Passe-Livre só traria benefícios. Legalmente, não há impeditivo à gratuidade no transporte público municipal. O que é preciso é trabalhar para que se criem as condições para que esse direito do cidadão seja atendido.  É uma questão de aperfeiçoamento do sistema público de serviços essenciais à população, de avanço democrático-social e de cidadania melhorada.

*Érick Facioli é jornalista e professor universitário, pós-graduado em Gestão de Cidades e mestrando em Saúde Coletiva

**Os artigos assinados por colunistas não traduzem necessariamente a opinião do Notícias.Botucatu.

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