Onde ou aonde?
A Norma Culta é importantíssima para manter a unidade linguística do país (ou de países que utilizem o mesmo idioma)
por professor Nelson*
Mais valorizada socialmente, a linguagem formal possui regras gramaticais e vocabulário que estão cada vez mais distantes da maioria da população brasileira. Isso se deve por vários motivos, desde o fato de os indivíduos do idioma luso-americano estarem afastados da leitura – o brasileiro lê cada vez menos (não me refiro a diálogos de redes sociais) -, o condicionamento linguístico imposto pela tevê, rádio e internet; até os problemas pedagógicos e estruturais da maior parte de nossas escolas privadas e públicas (conteúdos que individualizam e robotizam as crianças; ausência de leitura, de escrita, de pensamento crítico; salas superlotadas; a aprovação automática; a indisciplina; a extensa carga horária de professores etc.). Aquela pequena parte da sociedade que acredita falar corretamente também utiliza uma linguagem diferente do que manda a Norma Culta. E isso não ocorre apenas na fala, pois na escrita também encontramos os “desvios” linguísticos, se a compararmos ao que prescreve a gramática normativa.

Uma dessas transgressões mais comuns – virou até clichê de “letrados” corretores – é sobre o uso dos vocábulos onde e aonde. Os dois termos referem-se a lugar, assim eles não podem (poderiam) ser utilizados na referência a situações, a tempos etc.; todavia não é o que ocorre na linguagem dos brasileiros (mesmo os que se dizem conhecedores da linguagem formal). Vamos a um exemplo: “Meu carro ficou preso no congestionamento onde tive de esperar por mais de uma hora”. Reparem que a palavra onde está se referindo ao termo congestionamento. E este não é um lugar, mas sim uma situação. Para a gramática normativa, o correto é “… no congestionamento em que (ou no qual) tive de…”; ou mudando toda a estrutura “Devido ao congestionamento, meu carro ficou preso na estrada onde tive de esperar por mais de uma hora”. Neste caso o pronome onde se refere ao substantivo estrada, um lugar.
“Alô, mãe, aonde você está?” – eis uma frase comum de se ouvir entre interlocutores numa conversa telefônica. Acontece que o termo aonde consiste na combinação da preposição “a” com a palavra onde. Essa preposição, para ser utilizada na frase, precisa ser regida por um verbo ou por um nome. São os vocábulos de deslocamento que pedem esse conectivo. Já os vocábulos cujos valores semânticos sejam de ausência de movimento não o requerem. Portanto, de acordo com a Norma Culta, o correto é “Alô, mãe, onde você está?” (pois quem está, está em algum lugar). Mas, se a pergunta fosse algo como “aonde você vai hoje à noite?”, o uso do termo estaria adequado (pois quem vai, vai a algum lugar).
A Norma Culta é importantíssima para manter a unidade linguística do país (ou de países que utilizem o mesmo idioma). Por meio dela, comunica-se melhor; transmitem-se conhecimentos filosóficos, artísticos, científicos, linguísticos com mais precisão. Entretanto é importante os brasileiros os quais acreditam dominá-la, conscientizarem-se de que também a transgridem diariamente e de que isso é um fenômeno natural da língua, pois esta age como um organismo vivo que sofre alterações conforme o tempo vai passando. Mas isso não pode ser desculpa para não saber aproveitar as possibilidades de comunicação que a Norma Culta nos oferece. Para usufruirmos delas, não existe fórmula mágica, o caminho é: ter o hábito de ler bons textos, de escrever; estudar as regras gramaticais; e não se deixar contaminar, por exemplo, pela linguagem simples da internet (é necessário saber separar as duas escritas). Ou então sonharmos que as escolas brasileiras mudem sua estrutura, sua grade curricular, e seu conteúdo das áreas de conhecimento… Quem sabe um dia aconteça…
*Professor Nelson é formado pela Unesp de Assis