Desde que a humanidade se organizou em sociedades a política foi praticada, teorizada e modificada inúmeras vezes.
por Valdemar Pereira de Pinho*
Nos últimos tempos o baixo nível da maioria dos políticos tem sido escandaloso. Como consequência, a política tem sido demonizada. E, de fato, muitas das mazelas do nosso sistema são responsabilidades de políticos. Como resultado é comum ouvir pessoas dizendo, com orgulho, que detestam política. E que são apolíticas. Como se isso fosse possível. Mas, o problema está na política ou na forma como se faz política? É possível deletar a política como se faz com um aplicativo no celular?
Os conceitos de política são bem variados. Para Hobbes, política “consiste nos meios adequados à obtenção de qualquer vantagem”. Segundo Russel é “o conjunto dos meios que permitem alcançar os efeitos desejados”. Para Maquiavel é “a arte de conquistar, manter e exercer o poder, o governo”. Nesse sentido, a política é uma ferramenta para se obter e manter o poder. E o “poder” é necessário para que se possa atingir o objetivo, que deve ser o aprimoramento da sociedade. Mas, e se o objetivo principal for obter vantagens pra si e pros seus cupinchas, como parece ser o da maioria dos membros dos poderes? Nesse caso o problema está nos objetivos e não na ferramenta. Se alguém usa um martelo para cometer assassinato não se pode culpar o martelo. Ele não foi feito pra matar, o que houve foi um desvio dos seus fins. Certa vez, num debate, defini a política como a arte de viabilizar um sonho. Para mim esse sonho deve ser criado coletivamente pelos que têm o mesmo projeto de sociedade e o mesmo objetivo. E submetido à avaliação da sociedade.
Desde que a humanidade se organizou em sociedades a política foi praticada, teorizada e modificada inúmeras vezes. A elaboração de uma teoria estruturada começa com Platão, que defendeu que a decisão sobre questões políticas deveria ser exclusiva de sábios, pois o homem comum era incapaz de adquirir o conhecimento necessário para essa função. Seu discípulo, Aristóteles, avança e define as formas de governo em monarquia (governo de um só), aristocracia (governo de um pequeno grupo) e república (governo do povo), conceitos retomados posteriormente por Montesquieu. Alerta que a atividade política não deve apenas buscar o poder, mas, que se este não for exercido com profundo espírito público, a monarquia degenera em tirania, a aristocracia em oligarquia e a república em anarquia, seguida de tirania. No sec. XVI Maquiavel denuncia como utopia as concepções de Platão e seus seguidores e propõe que a política seja apenas uma técnica e arte para manter o poder para a consolidação da nação italiana, sem participação democrática. Hobbes (sec. 17) defende um governo com poderes absolutos, legitimado por um contrato social. Locke (sec. 17) critica o absolutismo e defende o controle dos excessos do executivo por um Parlamento legítimo representante do povo. Rousseau (sec. 18) vai além, propondo democracia direta com cidadania ativa e decisões em assembléias públicas. Montesquieu (sec. 18) defende a monarquia parlamentarista com equilíbrio entre os poderes Executivo e Legislativo. Na primeira metade do sec. 20, Gramsci destaca que a política pode e deve ser feita por todos os cidadãos, desde que compreendam os determinantes e as motivações da realidade social. Assim se tornam mediadores entre a sociedade política (Estado) e os movimentos sociais (sociedade civil). Outros, como Guattari e Deleuze, trabalham as dimensões políticas no cotidiano das pessoas.
Todas essas concepções são resultado do seu tempo. Mas, demonstram a necessidade da política na busca do aperfeiçoamento da sociedade e de soluções para as iniquidades sociais. Negar a política como ferramenta para atingir esses objetivos é retirar da humanidade um instrumento fundamental para a sua evolução. O que precisamos é aperfeiçoar o seu uso. Como fazer isso?
* Valdemar Pereira de Pinho é professor aposentado da Unesp e membro do Partido dos Trabalhadores, em Botucatu.