OPINIÃO | Cassação de Mandato

A reflexão não é por achar errado a cassação, mas sim pelo que representa a perda de um mandato que foi conferido pela população

por Giovanni Mockus*

O que há de mais primário em uma democracia é a eleição por meio do voto. Está no próprio preâmbulo da Constituição: o poder emana do povo. Mas e quando esse voto é corrompido? E quando esse voto é violado pelo abuso de poder político e econômico? Quando o “rouba mas faz, rouba mas é de esquerda, rouba mais é de direita” justifica a eleição de políticos comprovadamente corruptos e até mesmo condenados?

Na última semana eu protocolei na Câmara dos Deputados pela REDE Sustentabilidade o pedido de cassação de mandato dos Deputados Federais Paulo Maluf (PP/SP), João Rodrigues (PSD/SC) e Celso Jacob (MDB/RJ) por quebra de decoro parlamentar. Os três parlamentares formam hoje a Bancada da Papuda. Estão presos em Brasília, condenados em última instância por diversos crimes de corrupção.

Mockus, do Rede Sustentabilidade, durante o protocolo do pedido de cassação de Paulo Maluf

A ideia de uma pessoa condenada, cumprindo pena de prisão, manter as prerrogativas de mandato como salário, benefícios, estrutura de gabinete parece extremamente absurda para qualquer brasileiro (e é mesmo). Chegamos a inimaginável situação de um deputado-presidiário continuar recebendo o famigerado auxílio moradia! O mais natural seria a perda imediata do mandato, não? Não pela nossa Constituição.

Apesar da carta magna, em seu artigo 55, prever a perda de mandato daqueles que são condenados, a “homologação” dessa cassação precisa ser feita pela Câmara dos Deputados.

Temos hoje três deputados presos e condenados e o plenário não se manifestou. Nem mesmo aqueles partidos que levantam enfaticamente a bandeira de combate à corrupção. Vou lhes contar uma coisa: o corporativismo parlamentar recorrentemente faz ignorar a fronteira entre o certo e o errado para parlamentares e partidos políticos. Depende da conveniência!

Ciente dessa responsabilidade e reafirmando a razão de existir em contribuir com a sociedade para atualizar a política, a REDE protocolou os três pedidos de perda de mandatos, que seguem agora para o Conselho de Ética.

Entretanto, o curioso que quero compartilhar com vocês: enquanto eu protocolava os pedidos de cassação, a reflexão feita no primeiro parágrafo me ocorreu e perdurou por dias a fio. Uma vez que o poder emana do povo e a primeira definição de nossa democracia passa pela existência do voto popular, como cassar um mandato parlamentar?

A reflexão não é por achar errado a cassação, mas sim pelo que representa a perda de um mandato que foi conferido pela população. Assim como a eleição pelo voto direto é algo extremamente poderoso, a cassação do mandato eleito por esse voto é algo extremamente profundo e que nos remete a dois pontos principais: primeiro, as razões pelas quais esse mandato pode ser cassado (e a Constituição os enumera); e segundo, a origem do voto que elegeu aquele mandato importa (se ele foi corrompido pelo abuso de poder econômico, por exemplo, ou até mesmo se foi justificado pelo “vota mas….”).

Deixo claro aqui minha forte posição pela cassação dos mandatos da Bancada da Papuda. Os três casos apresentam fatores contundentes que justificam. Mas não defendo a perda desses mandatos como uma mera punição individual. Defendo justamente como um resgate desses mandatos ao povo brasileiro e que apenas ao povo conferem. Mandatos parlamentares não pertencem a políticos ou partidos, pertencem à sociedade brasileira. Partidos, políticos e a própria sociedade precisam entender isso.

* Giovanni Mockus é graduando em Gestão de Políticas Públicas pela Universidade de Brasília, dirigente nacional da REDE, Líder RAPS e um entusiasta por uma nova forma de se fazer política. Atualmente, Assessor Legislativo na Câmara dos Deputados. facebook.com/giovannimockus

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