OPINIÃO | A Economia brasileira está um pouco menor

Desde o final dos anos de 1990 vinha orientando suas pesquisas, orientações e publicações para fundamentar a ideia de Economia Solidária

por Maria Encarnação Beltrão Sposito*

Não se trata de retração da economia, com letra minúscula, expressa em indicadores como evolução do PIB, comportamento da inflação ou saldo da balança comercial. Estamos falando da Economia, área de conhecimento, para a qual Paul Singer, falecido em 16 de abril de 2018, contribuiu de forma espetacular, com suas ideias e com suas ações.

Sem dúvida, caberia, a ele, a aplicação da concepção de intelectual orgânico, proposta por Gramsci, na perspectiva dessa expressão, que designa aquele capaz de ser simultaneamente um expert, no seu campo de pesquisa e ensino, e um político capaz de orientar sua conduta e de se comprometer com as mudanças orientadas na direção de uma sociedade mais igualitária e democrática.

Sua formação profissional tem início no ensino médio, quando estudou eletrotécnica e teve continuidade em formação e carreira universitária que poderia, mas não o levou, a se afastar de sua atuação como metalúrgico sindicalizado na década de 1950.

Graduado em Economia, doutorou-se com tese que, depois, gerou o livro Desenvolvimento Econômico e Evolução Urbana, uma obra importante cujo caráter transdisciplinar já mostrava sua grande capacidade de articular aspectos afeitos à Sociologia, área de obtenção do título, aos de Economia, Geografia, História, Política e Demografia, sendo que, nessa última especialidade, realizou seu pós-doutorado em Princeton.

Desde a publicação de seu primeiro livro, em 1968, intitulado Desenvolvimento e Crise, trouxe a público mais de duas dezenas de outros. Tinha a grande capacidade de escrever de modo didático, de forma a que, mesmo, os leigos fossem capaz de compreendê-lo, sem, com isso, expor suas ideias de modo superficial ou impreciso.

A mesma atitude orientava suas exposições orais, palestras e conferências que imantavam a atenção dos que o assistiam. Ele nos fazia refletir sobre um dado assunto, a partir de muitos pontos de vista, colocando em evidência o potencial que há na apresentação do contraditório, ainda que sua posição apoiada em fundamentos marxianos, fosse mantida de modo coerente e inteligente. Ele era, assim, capaz de iluminar as questões do mundo contemporâneo, impulsionando a todos a reconstruir o edifício teórico sem desconsiderar seus alicerces.

Foi um dos fundadores do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento  (CEBRAP). Atuou como professor na Unesp, na PUC, e desenvolveu a maior parte de sua carreira docente na USP. Foi Secretário de Planejamento da Prefeitura Municipal de São Paulo, quando Luiza Erundina foi a prefeita.

Desde o final dos anos de 1990 vinha orientando suas pesquisas, orientações e publicações para fundamentar a ideia de Economia Solidária, transformando essas reflexões em subsídios para que muitos organizassem suas atividades na direção de refundação da nossa economia política.

Em conferência magna ministrada há muitos anos na Faculdade de Ciências e Tecnologia de Presidente Prudente, Unesp, ao ser interpelado por um jovem calouro sobre o papel que a Economia Solidária teria no âmbito de uma sociedade capitalista, o que, para quem indagava seria apenas uma reforma e não uma revolução, ele respondeu, respeitosamente e de modo didático, que conhecia bem as urgências dos trabalhadores que recorriam ao Núcleo de Apoio às Atividades de Cultura e Extensão em Economia Solidária (NACE/NESOL) da USP, no qual atuava; desejava que eles se organizassem em cooperativas, pois sabia que não tinham tempo para esperar por revoluções, mas poderiam realizar muitas transformações, cotidiana e paulatinamente, com suas próprias ideias e mãos.

Maria Encarnação Beltrão Sposito é Docente do Departamento de Geografia, Unesp, Câmpus de Presidente Prudente.

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