PRF-8: primeira emissora de rádio inaugurada em Botucatu completa 80 anos
O rádio não perdeu sua força diante do surgimento e popularização de outras mídias
por Adriana Donini*
Há 80 anos, em 30 de outubro de 1939, foi fundada a Rádio Emissora de Botucatu. O evento que marcou o início do meio radiofônico no município foi bastante aguardado e permeado por emotividade e celebração. Afinal, na época, inaugurar uma rádio, que era um canal de comunicação de destaque na sociedade brasileira, sem dúvida representava uma grande conquista.
O Botucatú Jornal, na edição de 1 de novembro de 1939, destacou a solenidade realizada no primeiro prédio da rádio – localizado na esquina das ruas Cesário Alvim (atual João Passos) e Moraes Barros. “Às 20 horas já os estúdios de PRF-8 achavam-se totalmente tomados, dificultando mesmo a entrada de autoridades e elementos pertencentes ao broadcasting dessa emissora. Defronte ao prédio onde funciona a mesma, uma multidão aguardava ansiosa a chegada das 21 horas, momento em que se deu o início da transmissão inaugural. O diretor-artístico dessa emissora, sr. Angelino de Oliveira, após ingentes esforços, apresentou um programa à altura do valor intelectual e artístico da nossa cidade”, publicou o periódico.
O prefixo da emissora, ou seja, PRF-8 foi divulgado também na inauguração, após bastante suspense. E essa junção de letras e número agradou os ouvintes, afinal, até hoje a rádio pioneira de Botucatu é carinhosamente chamada da PRF-8 ou F-8.
No entanto, vale ressaltar que a instalação desse meio de comunicação foi antecedida por várias ações que visavam essa concretização e tiveram início em 1934. A Sociedade Rádio Emissora de Botucatu foi instituída em 1936 e, em 27 de outubro de 1938, já eram vendidas as primeiras ações. A autorização para instalação da rádio foi publicada no Diário Oficial em 5 de julho de 1939. A partir daí, tiveram início seleção e contratação de locutores e cantores; organização da discoteca e do estúdio; e escolha do local para instalação dos transmissores. Emílio Peduti era o diretor-superintendente. Olívio Nardy assumiu o cargo de diretor-gerente e o compositor Angelino de Oliveira foi escolhido como diretor artístico.

Entre os primeiros programas se destacavam “Gentilezas” e “Jornal Falado”. As apresentações de cantores e conjuntos musicais integraram a grade de programação da rádio botucatuense pioneira já em seus primórdios.
A sintonia da emissora com a sociedade botucatuense foi imediata. No ano seguinte à inauguração, o grito de carnaval do município ocorreu no interior da rádio, que procurou acompanhar todos os movimentos da cidade.
Nos anos 1940, foi explorado o radioteatro, gênero que fazia sucesso em nível nacional. Grupos teatrais existentes no município passaram a compor esse tipo de produção. Textos de autores locais também foram radiofonizados.

O segundo prédio em que a F-8 se instalou, localizado na rua Marechal Deodoro, virou um símbolo da emissora. Em decorrência do papel desempenhado pela rádio, o espaço passou a ter relevância para a sociedade local. Em seu interior, além da programação, eram realizadas reuniões de associações. Muitos ainda subiam as suas escadarias em busca de auxílio. Isso sem contar que diversos funcionários consideravam a rádio como segunda casa e, mesmo fora do horário de trabalho, passavam por lá para uma conversa com os colegas. A emissora percebeu que ocupava um lugar especial no município, retrato disso é o slogan: “A primeira no coração da cidade” que começou a utilizar e se eternizou.
No início dos anos 1950, um grupo liderado por Adhemar de Barros, que era governador de São Paulo na época, e pelo deputado federal Geraldo Pereira de Barros adquiriu a F-8. E, em 1959, é que os irmãos Octacílio, Domingos, Élcio, Ozônio e Plínio Paganini assumiram o comando acionário da emissora, firmando o nome da família nessa empresa de comunicação. Plínio, que ocupou por mais tempo o cargo de diretor geral, foi o que se tornou mais conhecido.
Os programas de auditório sem dúvida foram um atrativo da PRF-8. Os que contavam com participação de calouros eram bastante apreciados pelo público. Uma produção comumente associada à história da F-8 é “No Reino da Gurizada”, na qual se apresentavam crianças. Durante a semana, o público infantil participava de ensaios com conjuntos de acompanhamento e, nas manhãs de domingo, as crianças mostravam seus talentos ao auditório lotado. Em cada semana, eram escolhidas as que mais se destacavam. O programa era complementado com distribuição de brindes e brincadeiras.
Os calouros mais jovens davam sequência às apresentações musicais no programa “Galeria dos Mirins”. Os cantores adultos se apresentavam no “Big Show F-8”. Posteriormente, tiveram início produções específicas do gênero sertanejo como o programa “Sertão em Festa”.
Várias pessoas comentam em depoimentos que, inclusive, tinham seus cotidianos pré-determinados por horários de programas de auditório, ou seja, conciliavam outras atividades de maneira a não atrapalhar a presença ao auditório ou ao menos estar disponível para poder escutar esses programas em casa.
Mas não eram apenas calouros ou cantores profissionais locais ou regionais que subiam no palco da F-8. No interior da rádio, foram promovidos shows de artistas conhecidos nacionalmente como, por exemplo, Nélson Gonçalves e Ângela Maria, que em suas apresentações eram acompanhados por músicos da rádio.
Alguns eventos se tornaram tradição na gestão da família Paganini. A celebração do aniversário da rádio era um deles. A Olimpíada Infantil também integrava as ações que a rádio promovia. Essa competição ainda se mantém e é realizada anualmente pela Prefeitura Municipal de Botucatu. Outra festividade estava relacionada ao Dia das Mães e se dividia em duas atividades. Cada dia da semana, os alunos de uma escola homenageavam as mães por meio de poesias e músicas. Essas apresentações eram veiculadas pela F-8, geralmente no final da tarde. Já no segundo domingo do mês de maio ou no sábado que antecedia o Dia das Mães (essa data sofreu variação ao longo dos anos), era realizado evento com sorteio de prêmios para as crianças que enviavam cartas e apresentações musicais. Essa festividade ocorria na Praça Coronal Moura (Paratodos) ou no estádio da Associação Atlética Feroviária.
Atualmente, muitas emissoras têm explorado a tecnologia na captação de informações conseguindo obter muitos dados sem sair das rádios, porém, até meados de 1990, a equipe da F-8 ia a campo. As transmissões externas eram destaques da rádio. Inaugurações, festas populares, desfiles de escolas, acidentes, resultados do vestibular da Unesp e jogos são alguns exemplos de coberturas realizadas.
Por falar em jogos, a PRF-8 mantinha equipe especializada em esportes, além de competições locais, transmitia os Jogos Regionais e Abertos, além de partidas que envolviam grandes times como Palmeiras, Corinthians e São Paulo. A emissora fez ainda cobertura de jogos preparatórios, realziados no Maracanã, para a Copa do Mundo de 1962, e de uma disputa da Copa Libertadores entre Peñarol, do Uruguai, e Santos.
A Rádio Emissora de Botucatu foi o local em que muitas pessoas iniciaram suas trajetórias e a consideram como escola porque foi o espaço no qual aprenderam a atuar no rádio e ainda onde tiveram aprendizados para a vida. Alguns, inclusive, partiram daqui para realizar o sonho de ingressar em emissoras de maior porte. Mesmo os que seguiram outras carreiras, reconhecem o papel que a F-8 teve para obterem sucesso em áreas diferentes.
Após o falecimento de Plínio Paganini, em 3 de janeiro de 1997, o gerenciamento da emissora ficou a cargo de seus filhos: Plínio, Edmundo, Vanderley e, durante um tempo, do sobrinho Francisco. Em 2007, o neto de Domingos Paganini, Caio Henrique Paganini Burini, foi quem assumiu a função de dirigí-la.
Em 2016, a rádio pioneira deixou de funcionar no prédio da rua Marechal Deodoro e permaneceu um período fora do ar. No ano seguinte, essa frequência não foi mais administrada por membros da família Paganini e passou ao comando de Vanderlei dos Santos, que iniciou sua carreira na F-8, mas tem longa trajetória na Rádio Municipalista.
A partir daí, essa empresa de comunicação seguiu uma tendência que tem se tornado comum, ou seja, a integração de emissoras a uma rede de rádios. Com a nova denominação de Jovem Pan News F-8, atualmente, em 1540 kHz AM, é possível ouvir a programação nacional da Jovem Pan e o programa local “O Palanque”, produção informativa tradicional que voltou a ser veiculada. O programa tem explorado recursos tecnológicos atuais. Além de poder ser acompanhado pelo dial, é possível sintonizá-lo por meio de transmissão realizada ao vivo pelo Facebook.
Com uma trajetória de muitas conquistas e desafios, a primeira rádio inaugurada em Botucatu chega aos seus 80 anos. Pesquisas têm mostrado que, ao contrário do que muitos previam, o rádio não perdeu sua força diante do surgimento e popularização de outras mídias. Ele tem se reinventado e continua entre os principais meios de comunicação. De acordo com a edição 2018 do e-book Kantar Ibope Media, 86% das pessoas, de 13 regiões metropolitanas participantes do levantamento, ouviam rádio, sendo que, para três em cada cinco indivíduos, escutar rádio era um hábito diário. Que o rádio botucatuense ainda tenha grandes avanços para continuar compondo a sua história.
*Adriana Donini é jornalista, mestre em Comunicação pela Unesp de Botucatu, com estudos tendo ênfase nos estudos da radiodifusão. É autora do livro “No ar: Rádio em Botucatu, Anos 1950 a 1970”, publicado em 2017 e organizadora do álbum “Personagens de Botucatu em Figurinhas”, lançado em 2019. Adriana é membro do Grupo Rádio e Mídia Sonora da Intercom.
**Material publicado originalmente na edição 45 da Revista Destaque Botucatu.