Análises feitas em amostras sanguíneas de pacientes com covid-19 moderada ou severa – coletadas no dia da internação – apontaram altos níveis de moléculas pró-inflamatórias, como IL-6, IL-1β, além de interleucina 8 (IL-8) e interleucina 10 (IL-10). Também foi observado, em comparação com o sangue de voluntários sadios, um aumento na proporção de monócitos circulantes (leucócitos que dão origem aos macrófagos) e, nesse grupo de células, uma maior proporção de monócitos com fenótipo pró-inflamatório.
A análise de expressão gênica indicou que os monócitos dos pacientes com covid-19 expressavam em menor quantidade os receptores CD36, SRA-I, ITGB5 e TIM4, quando comparados aos monócitos dos voluntários sadios. E, quanto mais graves eram os sintomas relatados no momento da admissão hospitalar, mais acentuada era a queda na expressão dos receptores fagocíticos, relatam os autores do artigo.
No teste subsequente, os monócitos dos pacientes com covid-19 foram “desafiados” in vitro com células apoptóticas de camundongo. Como esperado, foram bem menos eficientes na tarefa de limpeza do que os monócitos isolados do sangue de voluntários sadios.
Com auxílio de ferramentas de bioinformática, por meio de uma colaboração com o professor da USP Helder Nakaya, os pesquisadores reanalisaram dados de expressão gênica de estudos anteriormente publicados, disponíveis em bancos públicos. A análise confirmou que, nos pacientes com a forma grave da covid-19, a redução na expressão dos genes que promovem fagocitose de células mortas é bem mais acentuada do que nos doentes com sintomas leves.
Por último, foram analisadas células de defesa infiltradas em amostras de pulmão de pessoas que morreram de covid-19, obtidas por meio de autópsia. “Olhamos para células mononucleares que haviam sido recrutadas da circulação para combater o vírus no pulmão. Também nesse caso observamos queda na expressão dos receptores, o que sugere que essas células de defesa estavam com a capacidade fagocítica comprometida”, conta Cunha.
Segundo os autores, a falha na remoção de células mortas pode contribuir para o extenso dano aos tecidos observado nos pulmões de pacientes com covid-19. “Isso, dentre outros fatores, pode favorecer complicações respiratórias desenvolvidas por indivíduos com a forma grave da doença e aumentar a suscetibilidade a infecções bacterianas secundárias”, concluem.
O trabalho contou com a participação da equipe do Centro de Pesquisa em Doenças Inflamatórias (Crid) – um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) da Fapesp –, além de médicos e pesquisadores do Hospital das Clínicas da FMRP. Entre os autores do artigo estão os professores Fernando Q. Cunha, Alexandre T. Fabro, Helder Nakaya, Dario S. Zamboni, Paulo Louzada-Junior e Rene D. R. Oliveira.
O artigo Efferocytosis of SARS-CoV-2-infected dying cells impairs macrophage anti-inflammatory programming and continual clearance of apoptotic cells pode ser lido neste link.