SOS Cachoeiras: vamos preservar nossas riquezas

O outro desafio é a expansão urbana desordenada sobre áreas naturais

Por Jorge Martins*

O relevo da Cuesta em Botucatu é muito propenso a ocorrência de cachoeiras. Desta ruptura de 250 metros, em média, entre o topo da cuestas até a baixada serrana, vertem centenas de cachoeiras nos enclaves cercada pela nossa exuberante mata atlântica. Estimasse que somente no município de Botucatu existam mais de 100 cachoeiras. Imagine como era a visão da Cuesta a séculos atras, com uma mata atlântica exuberante e cachoeiras enormes vertendo de vários pontos da Cuesta, como grandes colunas brancas no meio do verde biodiverso de nossas matas.

No entanto, muitos obstáculos atrapalham e comprometem a segurança e a qualidade desses lugares. Desafios que vão desde a educação básica dos usuários, a falta de planejamento urbano até contaminação e as atividades do entorno.

É muito comum encontrar latinhas vazias, lixo e até fezes humanas nas trilhas e beiradas das cachoeiras. Aglomerações, churrascos e som alto são outras condutas que descaracterizam, degradam e poluem essas áreas naturais. Alguns comparecem a noite e fazem fogueiras que expõe a floresta ao risco de incêndios.

Muitas cachoeiras do município hoje se encontram em riscos de serem gravemente degradadas no curto prazo

O outro desafio é a expansão urbana desordenada sobre áreas naturais. Como o município de Botucatu fica no topo e bem próximo a Cuesta a mancha urbana, em alguns locais avança sobre o front da Cuesta sobre cachoeiras e suas cabeceiras. A impermeabilização de grandes áreas no entorno de cachoeiras também causa aceleração da erosão e assoreamento dos rios. Há ainda a contaminação das águas com esgotos domésticos e pelo descarte irregular de lixos. Presenças de cachorros, caça e outras interferências antrópicas também são muito negativas para essas áreas naturais.

Os diferentes usos do solo no entorno imediato de cachoeiras causam vários impactos sobre esses corpos da água. No geral as cachoeiras atualmente estão cercadas por pastagem degradada, ou por alguma das culturas agrícolas clássicas da região, como cana, eucalipto ou lavouras de cana, milho e soja. Lavouras de cana, soja e milho são muito agressivas e aceleram a contaminação das águas e assoreamento dos rios. Já os plantios de eucaliptos adensados em monocultura comprometem nascentes e exaurem o solo. Por sua vez as pastagens degradadas com gado livre, sem cercas de proteção favorecem a erosão e degradação dos rios e do solo.

Em sua grande maioria, os rios que formam as cachoeiras na nossa região estão sem mata ciliar ao longo de suas ocorrências e muitas nascentes estão desprotegidas. A retenção de águas em lagoas e seu uso para irrigação de culturas agrícolas também comprometem a vazão e qualidade dessa água. De várias maneiras, apesar de continuarem lindas, muitas cachoeiras apresentam sinais claros de degradação ambiental contínua.

Como o município de Botucatu fica no topo e bem próximo a Cuesta a mancha urbana, em alguns locais avança sobre o front da Cuesta sobre cachoeiras e suas cabeceiras.

Muitas cachoeiras do município hoje se encontram em riscos de serem gravemente degradadas no curto prazo. As cachoeiras do Complexo da Canela terão agora, por exemplo, seu entorno ocupado por lavouras de soja e milho mecanizadas que irão acelerar muito sua degradação, assoreamento e contaminação. A Pavuna, uma cachoeira linda, está sendo contaminada com esgoto a anos, por efluentes que derivam do despejo irregular de residências e instituições. A cachoeira dos Afonsos, na ponte Cruzeiro do Sul, poderia ser um excelente local de laser, pois está dentro da cidade. Mas, o cheiro de esgoto que vem de suas águas envergonha nossa cidade, que não pode desfrutar de algumas riquezas que tem.

Muitos locais, principalmente no topo da Cuesta, mostram sinais de erosão avançado. Nossa Mata Atlântica já está combalida e degradada. Nossos recursos hídricos estão sendo degradados. Então, a pergunta que temos que nos fazer é: O que será preciso acontecer ainda para que repensemos nossa relação com a natureza? Se mesmo dentro de uma pandemia e no meio da maior crise hídrica da história, com tendencia de agravamento, se ainda assim somos capazes de degradar, de sujar, de poluir, de assorear, de destruir lugares sagrados como as cachoeiras… Oque mesmo poderia nos fazer despertar, parar e começar a agir de forma mais consciente e sustentável!?

* Jorge Luís Araújo Martins é Médico Veterinário Especialista em Animais Selvagens e PhD em Biotecnologia Animal Especialista em Biologia da Conservação da Vida Silvestre. Acumula experiência de pesquisa em Instituições como Zoológico de Berlin, Museu Paraense Emilio Goeldi, UNESP, Conservação Internacional e WWF. Atua também como Consultor dando suporte a ações de Responsabilidade Socioambiental junto a Empresas.

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