Tema da redação foi “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil”
Por Nelson Ferreira Júnior*
E o tema da redação do Enem 2024 foi “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil”. A seguir confira um texto produzido pelo professor Nelson, da Escola de Redação Nelson Letras, sobre o tema deste ano.
Para o filósofo Aristóteles, a arte é a mimese da realidade. Tal concepção é confirmada por romances e canções brasileiros que vão de encontro à falsa imagem deste País, criada pela Casa Grande e que esconde e inferioriza a Senzala. A representação real pode ser encontrada, por exemplo, na literatura em O Mulato de Aluísio Azevedo, o qual no final do século XIX narrou o sofrimento de Raimundo que – embora fosse um cidadão de uma elite intelectual, não era aceito por esta devido à sua ascendência negra e escrava -, ou na música contemporânea pela crítica social de Mama África, de Chico César. As duas obras, de épocas diferentes, retratam a verdadeira face brasileira cujo reflexo, em grande parte, é desconhecido ou estigmatizado.
A obra de Aluísio Azevedo não foi bem aceita, na época, por aqueles que criavam e impunham uma imagem distorcida da realidade. Ideologia esta que continua predominando no País, haja vista que a maioria dos brasileiros desconhecem a herança africana. Os séculos de escravização e de imposição de valores europeus, ainda hoje, fazem com que os cidadãos brasileiros não tenham conhecimento sobre sua história de origem afro, assim como tenham preconceitos sobre essa cultura, o que pode ser observado pelo estereótipo negativo criado sobre religiões como a Umbanda e o Candomblé.
A “Mama África” foi maltratada por seu esposo europeu. Ela foi violentada, escravizada e a herança que ficou foi o preconceito, a exclusão e a pobreza. Assim, grande parte de seus filhos não a aceitam como mãe, muitos sequer a conhecem, possuindo apenas a visão passada pelo genitor usurpador. Mama África continua “solteira e tendo que fazer mamadeira todo dia, além de trabalhar como empacotadeira nas Casas Bahia”. Os filhos de pele escura deste solo não têm a figura paternal para alimentá-la, instruí-la, educá-la e, por isso, vivem na exclusão cultural e física, muitas vezes, não sendo aceitos como cidadãos brasileiros, já que são cerceados de seus direitos e deveres.
A real herança africana está na cultura cujos valores são estigmatizados, bem como no capital fruto da mão de obra escrava. Logo, é necessário que o Ministério da Educação e Cultura ofereça cursos remunerados para capacitar professores, bem como elabore cartilhas, separadas pelas etapas do ensino básico, que abordem aspectos históricos, sociológicos, literários, teológicos, artísticos os quais desconstruam a falsa imagem criada pelos dominadores europeus.
Essa cartilha deve ser trabalhada obrigatoriamente nas escolas públicas e privadas nas respectivas disciplinas com o conteúdo exigido em avaliações. Políticas afirmativas como cotas devem ser ampliadas para outros setores, como para cargos do executivo a fim de que representantes pretos tenham voz para criar leis de modo que a identidade nacional de origem africana seja conhecida e valorizada. Afinal, parafraseando Chico César, “deve ser legal ser negão, Senegal”, deve ser legal ser negão Brasil.
ESCOLA DE REDAÇÃO NELSON LETRAS
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*Nelson Ferreira Junior é professor.
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