Crianças não deveriam consumir alimentos ultraprocessados nessa fase
Da Agência Einsten
O relatório do Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (ENANI), lançado em setembro, revela que 20,5% do cardápio das crianças de 6 meses a 2 anos é composto de alimentos classificados como ultraprocessados, ou seja, produtos que concentram grande quantidade de gordura, açúcar, sódio, entre outros ingredientes, incluindo aditivos químicos. Biscoitos doces, farinhas instantâneas, chocolates, sorvetes e gelatinas aparecem entre os itens mais consumidos.
De acordo com especialistas ouvidos pela Agência Einstein, crianças não deveriam consumir esses produtos nessa fase, que é fundamental para a adoção de bons hábitos à mesa. Embora existam evidências de que o aprendizado do sabor se inicia dentro do útero, a introdução alimentar contribui para moldar o paladar e para a aceitação de um cardápio saudável a longo prazo.
Também chamada de alimentação complementar, costuma começar aos 6 meses, quando o bebê consegue se sentar e o sistema digestório está mais maduro. “Sucede à fase de aleitamento exclusivo, mas ainda assim, o leite materno segue como o principal alimento ao longo do primeiro ano de vida”, diz a pediatra Debora Ariela Kalman, do Hospital Israelita Albert Einstein.
Como ofertar os alimentos?
Se antigamente os bebês eram apresentados à papinha passada no liquidificador, hoje as diretrizes recomendam ofertar uma grande variedade de alimentos frescos e naturais. Entram em cena verduras, legumes, frutas, carnes, ovos, feijões e saem os sucos. Além do leite materno – ou fórmula, na impossibilidade da amamentação –, a única bebida indicada nessa faixa etária é a água.
O uso de ervas e especiarias para temperar as refeições é liberado, mas o sal não é indicado antes dos 12 meses. O açúcar também deve ser evitado até pelo menos os 2 anos de idade.
Também é importante cuidar do posicionamento do cadeirão para que o pequeno possa interagir com a família. Isso se houver a chance de alguma refeição coincidir com os demais integrantes. “Deve-se considerar todo o contexto, hábitos culturais e sociais, até porque a alimentação envolve muitos elementos”, ressalta Kalman.
A maneira como é oferecida a comida também varia, mas existem algumas táticas mais comuns:
Método tradicional
Nesse modelo, o bebê recebe o alimento na colher. Hortaliças, tubérculos, feijões e demais ingredientes costumam ser amassados antes, com um garfo, e oferecidos separadamente para que o pequeno tome contato com diferentes sabores e consistências. Recomendam-se carnes bem cozidas e desfiadas. Peixes e aves entram no rodízio junto da bovina.
“Vale atenção para os sinais de saciedade”, orienta a pediatra. Algumas crianças viram o rosto, outras trancam a boca. A médica orienta que não se deve insistir com as colheradas ou apelar para o clássico aviãozinho se o bebê parece não querer mais.
Outra orientação é evitar distrações, como o uso de telas, e ambientes estressantes, caso de praças de alimentação de shoppings.
BLW
Uma estratégia cada vez mais difundida é o Baby-Led-Weaning, ou BLW. Numa tradução ao pé da letra, significa desmame guiado pelo bebê, embora não estimule a interrupção do aleitamento.
Nesse método não se utilizam talheres, o pequeno usa as próprias mãos para levar a comida à boca. “A manipulação dos alimentos melhora a habilidade motora e estimula a autonomia”, diz a pediatra do Einstein.
Por outro lado, não há consenso científico sobre o risco de deficiência de nutrientes. A nutricionista Kinzie Matzeller, da Universidade do Colorado, nos Estados Unidos, tem estudado o método e apresentou resultados de uma pesquisa no Congresso da Sociedade Americana de Nutrição, realizado em junho passado.
“Observamos que os bebês que estavam seguindo o BLW consumiram quantidades semelhantes de calorias em comparação aos que seguiam no método tradicional”, relata Matzeller, em entrevista à Agência Einstein. Participaram da pesquisa 70 crianças e o trabalho foi publicado em julho no periódico Current Developments in Nutrition. A pesquisadora e seu grupo seguem com os trabalhos para avaliar a adequação de vitaminas e sais minerais.
Além da preocupação com possíveis carências nutricionais, há o medo de engasgo, que pode ser afastado com algumas medidas de segurança. A começar pela consistência, que deve ser macia. Vegetais crus e mais durinhos não são adequados. Tamanhos e cortes também requerem muita atenção. Sementes e caroços não podem passar despercebidos.
Cenoura, beterraba, chuchu, abobrinha, entre outras hortaliças, após cozidas, devem ser cortadas de modo que o bebê segure com uma ou as duas mãos. A forma de palito, da grossura de dois dedos adultos, é um exemplo.
Pede-se ainda muita cautela com itens de formato arredondado, como ovo de codorna, uva, tomate-cereja, entre outros, que precisam ser fatiados. Pedaços pequenos são indicados para os maiorzinhos, após os 9 meses, que tendem a apresentar domínio do movimento de pinça, que envolve o dedo indicador e o polegar.
Sobre as carnes, a sugestão da nutricionista é oferecê-las cortadas em tiras, de maneira que o bebê consiga pegar. Almôndegas caseiras ou demais preparações com a versão moída são interessantes. Já os cubos devem ser evitados.
O desenvolvimento e as habilidades cognitivas ditam as regras de segurança ao oferecer a comida. Kinzie Matzeller reforça a importância de oferecer diferentes texturas e formas de alimentos para encorajar hábitos alimentares saudáveis.
Método participativo
Há ainda uma derivação do modelo tradicional que junta algumas características do BLW e é conhecido como método participativo.
“Nesse caso, talheres são permitidos, também pode haver intervenções como desfiar a carne ou amassar o feijão”, orienta a pediatra. E o bebê é estimulado a interagir, manipulando os alimentos, sentindo texturas, numa estratégia que contribui para o desenvolvimento motor.
Cada família deve optar pelo método que se encaixa ao contexto e à rotina da casa, conforme as características da criança e sempre com a orientação do pediatra que a acompanha.