Adoçantes artificiais são associados ao declínio cognitivo acelerado
Mesmo os chamados “naturais” recebem a classificação de ultraprocessados. “Ainda que alguns adoçantes tenham origem natural, como a estévia, eles são isolados e concentrados por meio de processamento industrial e adicionados a produtos nos quais não estariam presentes naturalmente.”
Para a professora, o estudo atual é extremamente relevante para a saúde pública e usa uma metodologia confiável. “O estudo de seguimento é dos delineamentos mais adequados para investigar esse tipo de associação.” Ela comenta ainda que uma das maiores dificuldades para estudar o efeito nocivo dos edulcorantes é quantificá-los com precisão nos alimentos. “Essa informação não está disponível nas tabelas de composição de alimentos nem nos rótulos. E a quantidade varia entre produtos e até entre marcas de um mesmo produto”, pontua, ao explicar que essa informação é crucial para que se possa gerar evidências mais robustas. “Isso reforça a necessidade de maior transparência na rotulagem e de bases de dados mais completas”, defende.
Domínios da cognição
Neste estudo, o desempenho nos vários aspectos foi avaliado individualmente, para depois se calcular uma pontuação de cognição global, que é o índice considerado de maior importância. “A cognição é formada por diversos domínios, e quando você tem um problema em vários, o impacto é maior”, explica Claudia Suemoto.
Os testes cognitivos estimaram capacidades como memória episódica (de recordar eventos e experiências específicas, incluindo detalhes como o que, onde e quando); fluência verbal (de gerar palavras dentro de uma categoria ou que começam com uma letra específica); e função executiva (de direcionar comportamentos a objetivos, envolvendo flexibilidade mental e velocidade de processamento para tomada de decisões).
Isolando as variáveis
Todo estudo observacional como este, que busca isolar o consumo de algum item e associá-lo a um desfecho como declínio cognitivo, que tem diversos determinantes, esbarra em confundidores que o tratamento estatístico dos dados procura mitigar.
Claudia Suemoto simplifica com um exemplo. “Digamos que eu queira saber se álcool contribui para o desenvolvimento do câncer de pulmão. Se eu não fizer um controle para o fator tabagismo, vou achar uma relação errada. Porque, normalmente, entre quem consome mais álcool também estão os que fumam bastante. E o tabagismo é um fator de risco conhecido para câncer de pulmão.”
Nesta pesquisa, em relação ao consumo de adoçantes, foram consideradas variáveis sociodemográficas (idade, sexo, renda, raça e educação), de estilo de vida (atividade física, tabagismo, consumo de álcool e padrão de dieta) e clínicas (índice de massa corporal, diabetes, hipertensão, doença cardiovascular e depressão).
Dietas saudáveis (por exemplo, a dieta mediterrânea, a Dash – focada em reduzir a hipertensão – ou a Mind, que é uma combinação das duas primeiras) aparecem como fator de proteção para o declínio cognitivo e demência, enquanto obesidade e diabetes são fatores de risco. Mas o diabetes é sem dúvida o maior confundidor. “Quem tem diabetes já tem indicação de tomar adoçante. Ao mesmo tempo, o diabetes é um fator de risco conhecido para declínio cognitivo”, observa a professora ao Jornal da USP, enfatizando a complexidade da relação.
Feitos os ajustes, a obesidade e o padrão da dieta não modificaram a associação entre o consumo de adoçantes e o declínio cognitivo, mas o diabetes sim: em indivíduos sem diabetes, o maior consumo de adoçantes foi ligado a um declínio mais rápido na fluência verbal e na cognição global. Já para os participantes com diabetes, a ingestão de adoçantes mais alta foi associada a um declínio mais rápido, tanto na memória quanto na cognição global.

