Cidadão, você sabe o que é um Plano Diretor Participativo? Saberia por exemplo, dentro desse contexto, como você poderia tornar-se um agente de transformação social por meio desse instrumento?
por Diogo de Castro Lopes* | foto Flávio Fogueral
A lei sim, lhe confere esse poder. O poder da participação, associado ao controle social, ou seja, a ação fiscalizadora e colaboração junto aos representantes eleitos pela nossa sociedade e a cidadania pode mudar o rumo da história. Para isso é preciso ficar atento, é preciso prestar atenção!
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Vamos analisar o processo de revisão do Plano Diretor Participativo (PDP) de Botucatu-SP (PLC:483/007), considerando a apresentação do governo municipal realizada ontem, dia 19 de maio de 2015, demonstrando com argumentos a tese da falta de pluralidade no planejamento participativo, além da velha verticalização dos processo de decisões públicas. Foi assinado na ocasião um decreto (projeto de lei sem necessidade de tramitação no legislativo) pelo representante do Executivo, estabelecendo a nomeação dos membros do “núcleo gestor“: nome este dado a uma comissão responsável pelo processo de revisão do PDP.
Um breve contexto histórico envolveria um grande esforço para explicar sobre a origem desse instrumento legal, o Estatuto das Cidades e sua exigência de elaboração por munícipios com mais de vinte mil habitantes. Para isso insiro links para que se você não saiba o que são esses instrumentos, possa encontrar referências e consiga entender a importância deste processo para o município.
O decreto municipal nomeou os participantes para a condução da revisão da lei complementar N: 483/007.
Importante dizer que essa lei complementar, quando elaborada em 2007, teve um processo participativo amplo e complexo de debates presenciais e que na opinião de muitos munícipes presentes poderia seguir a mesma lógica na sua revisão, considerando a falta de espaços de participação, fora dos conselhos e do legislativo.
A sensação evidente da falta do debate e do diálogo ou da participação, quer seja para analisar ou qualificar os critérios de decisões desses que foram nomeados, ou dos eixos temáticos sugeridos, ou das ações já realizadas nos três anos que se passaram é o ponto nefrálgico da situação.
Munícipes lamentaram a falta da Fundação Florestal, que vem liderando de forma coerente os trabalhos a frente da APA – Área de Proteção Ambiental e seu plano de manejo, para citar um exemplo. Também se comentou a falta de representantes da cultura, da segurança e da assistência social na “escalação do time”. A foto oficial ficou e muito, parecida com uma equipe futebolística entrando em campo.
Este núcleo foi composto por pessoas que estão dentro da base aliada do governo municipal, até mesmo representantes da sociedade civil estão ligados a Prefeitura por meio de parcerias, quer seja com convênios ou por outros tipos de vínculos.
Alguns desses comentaram que não estavam sendo informados da estratégia escolhida pela prefeitura, ou seja, da criação de um núcleo gestor, tomando ciência poucos dias antes desse evento da propositura.
Outro ponto desse processo é a possibilidade dos eventos pró-forma, quer seja do núcleo gestor, ou do site aberto para o recebimento de sugestões, não serem tão atenciosos a oportunidade da interação presencial e transversal com a coletividade, reduzindo a Audiências Públicas a interação, isso enfraquece o debate, sem promover a transdisciplinariedade entre os protagonistas das sugestões em espaços livres e ou com condução não formal .
“Gostaríamos de saber quais foram os critérios de decisões utilizados pelo governo municipal, para adotar o núcleo gestor bem como eleger seus participantes e quais serão os critérios de decisão para eleger as sugestões enviadas, gostaríamos de ter acesso a totalidade dessas e debater as prioridades de forma participativa”. – indagou João Batista de Oliveira, da ONG Nascentes e morador do bairro Demétria.
A estratégia elegida pela Prefeitura de Botucatu demonstrou a necessidade de evolução, tanto no que tange uma melhoria na conduta ética, por exemplo, de abrir para participação o processo de revisão iniciado a três anos, como a promoção do desenvolvimento de competências dos protagonistas e antagonistas previamente, garantindo a qualquer interessado a possibilidade de informar-se sobre os formatos de participação bem como o estabelecimento dos acordosem relação aos critérios de decisões, como dos nomeados ao núcleo gestor e sua agenda de operação (processos).
O próprio processo de apresentação utilizado durante o evento de ontem replica um modelo ultrapassado de diálogo com a sociedade: duas horas de apresentações expositivas, sem interação, abertura ao público para questionamentos ou construções coletivas, tempo que poderia ser melhor aproveitado, caso houvesse a aplicação de métodos de facilitação de grupos, promovendo uma gestão horizontal da comunicação ou do(s) evento(s).
A expectativa de conhecer e debater com profundidade os critérios utilizados para a condução bem como a escolha de seus participantes elegidos pelo poder executivo e a falta da divulgação antecipada do cronograma de atividades,, incluindo essa reunião, causaram uma profunda reflexão nos presentes: Quais os modelos de governabilidade participativa existentes e qual dentre estes podemos eleger de forma conjunta em Botucatu?
Ficou claro que o processo esta dentro do que conhecemos como pro-forma, ou seja, o governo posicionando-se como antagonista, ao invés de protagonista, cumprindo seu papel legal de convidar a municipalidade para as audiências públicas, abrindo canais de sugestões, porém, deixando de promover e estimular espaços e tempos para a co-criação, debates presenciais, e a colaboração, com a escusa de que por se tratar de uma revisão, e não elaboração, podemos verticalizar e isolar os atores envolvidos por meio de uma ferramenta eletrônica e audiências públicas.
As audiências públicas me parecem, por experiência, ineficazes para o processo de construção e colaboração, uma vez que trazem em seu processo restrição de tempo de falas e atua de forma não linear, podendo até excluir a participação de pessoas devido ao tempo da restrito da sessão. Foram necessárias, por exemplo, mais de cinco reuniões públicas e três audiências públicas para construirmos o Código Municipal Ambiental (leia aqui, aqui e aqui).
Mais uma vez a população deverá ter um papel fundamental, não somente para o envio de sugestões e a participação das audiências, mas principalmente de não temer a visão crítica e do questionamento de cobrar esclarecimentos frente a esse início que se não desastroso na minha opinião, me fez sentir vergonha alheia da plateia.
Questionamentos e apontamentos iniciais:
1. Quais são os formatos que os cidadãos querem para o processo de revisão do plano diretor participativo? Isso foi questionado antes?
-> O argumento de que a população não participa ou não tem interesse é falácia. É necessário sim estimular, instruir e atuar em rede.
2. Quais foram os critérios para definir os elegidos a participarem do núcleo gestor?
-> E se quisermos que outros técnicos integrem o grupo, poderá ser incluído? É Participativo mesmo? Desde o início?
-> Gostaríamos de sugerir nomes para integrar o núcelo: Claudia Reis – Fundação Florestal e Renata Fonseca da UNESP/FCA.
3. Esses, que foram incluídos no núcelo, representam a totalidade da cidade e dos eixos temáticos?
4. As reuniões do núcelo serão abertas e participativas?
-> A prefeitura comentou que a sociedade deve se organizar, porém, qual o esforço da Prefeitura em comunicar esse processo previamente, além dos canais oficiais?
-> Essa reunião por exemplo foi confirmada na sexta-feira dia 15/05 e realizada no dia 19/05.
-> O tempo e os canais de divulgação forãm suficientes?
5. Haverá acesso para consultarmos e acompanharmos todas as sugestões enviadas pelo site em tempo real?
-> É importante visualizarmos a totalidade das sugestões e acompanhar o processo em tempo real.
6. Será emitido um protocolo ao envio das sugestões pelo site?
-> Como rastrear uma sugestão?
-> E se ela não for acatada, será emitido uma resposta? Como mediar um conflito?
7. Haverá espaços físicos para aprovarmos em plenárias populares quer seja por voto ou por consenso as prioridades das sugestoes enviadas?
-> Não é desejável, na minha opinião que um núcleo de 30 pessoas decida por toda uma cidade, seria necessário plenárias com representantes das zonas e bairros, seguindo o exemplo do Orçamento Participativo.
8. Qual a dificuldade em abrir a fala para os participantes em eventos oficiais?
-> Seria de grande valia e extremamente frutuoso se a Prefeitura pudesse promover a inteligência coletiva, oferecendo a palavra aos que prestigiam o seu evento.
9. O que motivou o decreto e como isso impacta a utlização de qualquer outra metodologia de auto-gestão ou gestão participativa?
10. Como se amplia a pluraridade desse núcelo gestor, se tal decisão não foi debatida previamente, como poderá ser agora?
11. Como mediar os conflitos que já estão evidentes nesse primeiro processo como por exemplo os itens 10, 9, 7, 2?
12. Caso seja necessáro mediar os conflitos: quais os métodos, mediadores e foro?
->Não podemos contar com uma audiência pública para esse processo.
13. Da totalidade de conselhos municipais, quantos constam em ata a notificação da existência do trabalho de revisão do Plano, iniciada há três anos, citado pela PM.
14. Da totalidade de conselhos municipais, quantos constam em ata a informação sobre o processo de formação do processo formal bem como da criação do núcleo gestor?
15. Como podemos enviar mapas pelo site? Não encontramos “anexos”.
16. Como podemos consultar os mapas do macrozonemaento atual?
17. Como podemos comparar o marcrozoneamento atual com o proposto?
18. O tempo disponível para envio das sugestões é o ideal?
19. Quando teremos a agenda do núcleo gestor disponível no site:
http://www.pdp.botucatu.sp.gov.br/index.php/agenda
O que esperamos como sociedade?
1. A pluraridade (Debate sobre a validade do decreto – cabe a análise jurídica sobre esse instrumento para esse processo).
2. O aprofundamento do processo participativo, desde da pluraridade do núcelo gestor até a instrução da população sobre a importância da participação.
3. O acesso a informação, como incentivo, agendando colaboratórios (laboratórios de colaboração) com o objetivo de estimular o processo de participação
4. Tempo hábil para conduzir o processo. Como foi informado no evento, pode-se esperar até 2017 para a revisão, então podemos co-criar o processo de forma ampla, profunda, horizontal e auto-gestionada.
5. Debater a regulamentação do Plano, já que revisão e regulamentação são itens complementares.
6. Reorganizar os delegados das zonas/bairros e representantes comunitários por meio do Orçamento Participativo.
7. Debater a finalidade do conselho municipal da cidade e a transversalidade das secretarias.
8. Debater um método de gestão participativa ética desejável para o processo de colaboração e co criação da revisão.
9. A comunicação e promoção instrucional do processo ao máximo de munícipes.
10. Ferramentas transparentes acessíveis a todos os munícipes e não somente a um núcelo gestor elegido pelo poder executivo.
11. Oportunidades de diálogo horizontal com o núcleo gestor, abertamente.
12. Indicar representantes dos cidadãos ao núcleo gestor, não sendo este apenas formado por pessoas indicadas pelo executivo, via decreto, mas que contenha representantes de comunidades menos favorecidas socialmente.
Não é novidade que o processo operacional padrão do governo atual é comparado com um “rolo compressor”, metáfora utilizada pela imprensa radialista ao referir-se a bancada “da situação” ou seja, da coligação que apoia o atual governo.
Mais uma vez a população poderá ser esmagada pela máquina, como foi por tantas vezes: a maioria presente comemorou a escalação “da seleção do núcleo gestor”, sem espaços para uma análise crítica. Para quem se sente contemplado com este processo, é de direito comemorar, para quem não, é de direito questionar. Isso é maturidade social. Sem emoções. Sem hipocrisia.
Analisando o termo de referência disponibilizado no site encontramos inovações e incoerências, a enfâse que daremos a ambos é o que garantirá a nossa evolução. Esse será tema de um outro artigo, após uma análise profunda.
Nas entrelinhas do áudio, aqui disponibilizado é possível escutar o conteúdo de todo o evento, salvo a linda canção de Angelino de Oliveira, canção de Botucatu a qual aqui cito como referência.
É possível perceber que em nenhum instante as palavras “águas”, “mudanças climáticas” e “produção de alimentos”, foram inseridas nos discursos, muito embora esteja presente dentro do termo de referência, já por outro lado, palavras grávidas ou seja, genéricas como sustentabilidade já tornaram-se cliches em discursos políticos, mas falta coerência.
Poderíamos ter usado o tempo e espaço para aprofundarmos questões urgentes? Com a possibilidade de interação, poderíamos construir juntos em duas horas algumas propositoras afirmativas? Considerando a possibilidade do extermínio da humanidade, considerando a condição do planeta segundo os estudos dos cientistas divulgados durante a conferência de 2013 do IPPC, a próxima e última reflexão é não perder tempo para encontrar o meio de:
Inserir quem mais necessita participar desse processo: “o munícipe – joão ninguém” junto ao núcelo gestor, para que avancemos como comunidade frente aos desafios da falta de planejamento territorial e social adequadas.
Escute o áudio do evento na íntegra aqui.
Referências:
Métodos de gestão participativa: Sociocracia, Dragon Dreaming
Processo de revisão do Plano Diretor Participativo de São Paulo
Diogo de Castro Lopes é Membro fundador da Associação Parque Tecnonógico Botucatu, Voluntário e Ex-Presidente da Associação Nascentes (2011 – 2015), participando dos Conselhos Municipais de Meio Ambiente e Segurança Alimentar, do Comitê de Bacias do Médio Paranapanema e do Comitê de Inteligência da CPORG/SP – Comissão Estadual de Produção Orgânica de São Paulo.