OPINIÃO | O que são APPs? (Bacias Hidrográficas como estratégia de planejamento – Parte 2)

Restrições jurídicas e recomendações para as APPs não podem ser ignoradas nos planejamentos de uso e ocupação do solo

por Patrícia Shimabuku*

Dando continuidade, a sequência de textos sobre “Bacias Hidrográficas como estratégia de planejamento”, este abordará uma das figuras mais importantes da paisagem das bacias/sub/microbacias hidrográficas, a APP (Área de Preservação Permanente).

Segundo o inciso II do Art. 3º da Lei Federal no. 12.651/2012 (conhecida como “CÓDIGO FLORESTAL”) define a APP como uma “área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas”.

Antes das reflexões sobre a importância das APPs, extraímos outras partes do Código Florestal para fundamentar as observações sobre a nossa cidade, que aqui, serão apontadas.

Art. 4o  “considera-se APP, em zonas RURAIS ou URBANAS, para os efeitos desta Lei:

I – as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de: (verificar a imagem para as faixas com suas respectivas APP).

III – as áreas no entorno dos reservatórios d’água artificiais, decorrentes de barramento ou represamento de cursos d’água naturais, na faixa definida na licença ambiental do empreendimento;

IV – as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros

V – as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior declive;

VIII – as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais; (Aqui vale uma inserção de suma relevância. No caso particular da formação geomorfológica, a Cuesta Basáltica, o Plano de Manejo da APA Corumbataí – Botucatu – Tejupá perímetro Botucatu na redação da Zona de Conservação do Patrimônio Natural ZCPN, a Lei Orgânica Botucatu em seu art. 162, e na Lei Complementar Municipal no 483/2017,  esta faixa é mais restritiva: “O Município declarará de Utilidade Pública uma faixa de terras de 250 metros de front da Cuesta de Botucatu, em direção ao reverso, visando sua recuperação, preservação e segurança.”. Sendo assim, seguindo os ideais jurídicos, vale-se os regramentos mais restritivos).

IX – no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação;

Art. 7o  diz que a vegetação situada em APP deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, e em seu parágrafo primeiro: tendo ocorrido supressão de vegetação situada em APP, o proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título é obrigado a promover a recomposição da vegetação, ressalvados os usos autorizados previstos nesta Lei.

Art. 8o diz que a intervenção ou a supressão de vegetação nativa em APP somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas nesta Lei, e em seu parágrafo primeiro, a supressão de vegetação nativa protetora de nascentes, dunas e restingas somente poderá ser autorizada em caso de utilidade pública.

Tantas restrições jurídicas e recomendações para as APPs não podem ser ignoradas nos planejamentos de uso e ocupação do solo, principalmente em meio urbano. Estas restrições além das considerações ecológicas, abordam as questões de segurança e defesa civil.

Dentre as diversas funções ou serviços ambientais prestados pelas APPs sinalizaremos alguns: (1) a proteção do solo prevenindo a ocorrência de desastres associados ao uso e ocupação inadequados de encostas e topos de morro; (2) a proteção dos corpos d’água, evitando enchentes, poluição das águas e assoreamento dos rios; (3) a manutenção da permeabilidade do solo e do regime hídrico, prevenindo contra inundações e enxurradas, colaborando com a recarga de aquíferos e evitando o comprometimento do abastecimento público de água em qualidade e em quantidade; (4) a função ecológica de refúgio para a fauna e de corredores ecológicos que facilitam o fluxo gênico de fauna e flora, especialmente entre áreas verdes situadas no perímetro urbano e nas suas proximidades, (5) a atenuação de desequilíbrios climáticos interurbanos, tais como o excesso de aridez, o desconforto térmico e ambiental e o efeito “ilha de calor”.

Um município que está pleiteando o título de “Município de Interesse Turístico”, a manutenção das APP urbanas torna-se mais que necessária, pois possibilitará a valorização da paisagem, do patrimônio natural e construído (de valor ecológico, histórico, cultural, paisagístico e turístico). Além do que, esses espaços exercem, do mesmo modo, funções sociais e educativas relacionadas com a oferta de campos esportivos, áreas de lazer e recreação, oportunidades de encontro, contato com os elementos da natureza e educação ambiental (voltada para a sua conservação), proporcionando uma maior qualidade de vida aos seus munícipes.

Os efeitos indesejáveis do processo de urbanização contemporâneo, como a ocupação irregular (regiões do entorno dos córregos, arruamento sem considerações técnicas das microbacias, projetos de drenagem que direcionam as águas pluviais sem considerar a calha natural do corpo hídrico ou sobre nascentes, ou simplesmente, a omissão das especificidades e fragilidades da Cuesta e os regramentos de uso das áreas do seu reverso) tem como consequência a redução e danos as APPs (sejam elas urbanas ou rurais) como podemos observar em vários pontos de nossa cidade (problemáticas socioambientais que persistem e que de certa forma, multiplicam-se, pois, as considerações jurídicas e técnicas não são respeitadas nos projetos habitacionais e de drenagem urbana, causando danos ecológicos muitas vezes irreversíveis, comprometendo por exemplo, as possíveis reservas de abastecimento público de água (em quantidade e qualidade) bem como as reservas financeiras públicas, que cada vez, estão amis escassas).  

Agora que você sabe o que são APPs, não deixe de observar como estão os córregos e suas matas ciliares. Será que estão sendo respeitados como preconiza a Lei? Não deixe de ler o próximo texto: “Bacias Hidrográficas Urbanas”, com esta leitura, você compreenderá a irresponsabilidade do processo de urbanização contemporâneo (enchentes, inundações e deslizamentos).

* Patricia Shimabuku é farmacêutica industrial, professora e ativista socioambiental.

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