Assembleia será realizada neste sábado (8) para definir se patrimônio irá para Prefeitura ou continuará com entidade
Reportagem e fotos por Sérgio Viana
Em 1958, um grupo formado por estudantes da então Escola Normal Dr. Cardoso de Almeida – atual E.E.C.A. – e admiradores do teatro fundou o Teatro Amador da Escola Normal Cardoso de Almeida, o Taenca. Sem muitos recursos para aperfeiçoar e sediar as atividades teatrais, o grupo contou com a colaboração de diversas pessoas, como a importante família Pedutti na época, o poder público, que doou um terreno para a construção de um teatro, e João Nelli, bancário, que acabou dando nome ao prédio construído, hoje conhecido como Cineteatro Nelli.
Com o passar do tempo, o grupo que recebeu e preparou nomes importantes para o teatro e dramaturgia, como o escritor e dramaturgo botucatuense Alcides Nogueira, foi se desmanchando e passou a existir apenas de maneira burocrática. O prédio que periodicamente sediava peças de teatro promovidas e convidadas pelo Taenca acabou se tornando apenas um cinema – alugado então por um dos membros do grupo, Tasso Nunes da Silva, hoje com mais de 80 anos, que então controlava as finanças através de uma conta da associação e nada mais produzia em relação às artes cênicas.
Mais recentemente, há cerca de 10 anos, a vontade de recuperar o Taenca para as mãos de uma associação e não de uma única pessoa surgiu, e alguns interessados, após contratarem os serviços de um advogado, conseguiram na justiça repassar o prédio Nelli e a conta bancária de volta à associação Taenca.
O advogado em questão, trata-se de Samir Daher Zacharias. “Há lei estabelecendo que no caso de extinção do Taenca, o prédio do cinema e o restante do patrimônio serão repassados para o poder público, no caso, a Prefeitura. E essa extinção já era o nosso objetivo quando tentamos retomar o Taenca. A instituição já estava há 26 anos sem qualquer atividade”, explica Samir.
Agora, o momento de decidir pela dissolução da entidade chegou. Uma primeira assembleia para votação foi convocada em 17 de dezembro de 2013, no entanto, parte dos integrantes que formam a associação Taenca, se sente enganada. Ao todo, após a restituição do grupo, eram vinte os associados – dois faleceram. “Nossa intenção era retomar o Taenca para tocar o grupo. Queremos promover, como sociedade civil, atividades culturais naquele espaço. Chamar os grupo de teatro que existem hoje em Botucatu, para que eles possam se utilizar também e fazer uma espécie de transição. Temos, inclusive, a ideia de formar uma escola de música, buscar convênios com outras entidades, como o Conservatório de Tatuí, por exemplo”, é o que defende João Narciso Aguiar, um dos membros do ‘novo’ Taenca contrários a extinção do grupo e à entrega do patrimônio à Prefeitura.
Além do Cineteatro Nelli, quando foi recuperado, o Taenca tinha em sua conta um montante de cerca de R$500 mil. O valor correto deveria ser maior – o dobro -, mas a má administração teria se utilizado de recursos indevidamente (nesse caso correm outras ações judiciais de recuperação), além de sonegar a receita, o que resultou em inúmeras dívidas em nome do grupo. Este, segundo o advogado Zacharias, foi o motivo pelo qual a extinção não foi colocada em votação e decidida antes, “era preciso sanar as pendências. Hoje temos ainda R$300 mil em caixa.
O caso do Taenca ser uma possível reconquista para a Prefeitura, foi explicado por Samir ao prefeito João Cury (PSDB), que então o teria instituído como responsável em reaver o patrimônio ao município.
O senhor Pedro Sansão, que foi instituído presidente do novo Taenca em 2012, quando o grupo foi recuperado, defende a restituição do patrimônio ao Poder Público. “Neste grupo que formamos, todos estavam a favor da extinção e, apesar disso, ainda queremos colocar democraticamente em votação. Se o Taenca continuar a existir como hoje, ele servirá apenas ao interesse particular de alguns, mas com a Prefeitura poderá servir a todos”, pondera.
Já o senhor José Paes de Almeida, irmão de Alcides Nogueira e filho de Sebastião Almeida Pinto – um dos fundadores do grupo na década de 50 -, escreveu um texto emocionado e através de amigos postou no Facebook, defendendo a manutenção do Taenca, ou pelo menos a criação de um debate público sobre isso, para que não seja decidido ‘num grupo tão pequeno de pessoas’. “Queremos abrir a discussão com o pessoal da classe, do teatro. A gestão da cultura não precisa ser só do Poder Público, os Pontos de Cultura estão aí para comprovar isso. Como um grupo pequeno pode decidir o futuro de uma entidade tão rica? Trata-se de uma questão de respeito com a memória do Taenca e seus fundadores”, argumenta.
Já para Samir Zacharias, se o Taenca continuar a existir corre-se o risco de servir ao interesse particular de algumas pessoas, como no passado. “Hoje, temos laudos, para reestruturar e adequar o espaço do cinema é necessário gastar cerca de R$1 milhão, com o que nos sobrou em caixa (300 mil) não dá para fazer nada. A ideia é garantir que se torne patrimônio público e sirva para receber projetos culturais, como o Projeto Guri, além de sediar eventos. Não extinguir o Taenca é uma tentativa de prevalecer o interesse privado sobre o público”, afirma o advogado.
O fato é que de um lado, membros da associação reconhecem que recuperar o Taenca foi a solução encontrada para, depois disso, extingui-lo e dá-lo ao Poder Público. Enquanto do outro lado, associados se sentem enganados por nunca terem querido dar fim à entidade e não acreditam na capacidade da Prefeitura em tomar conta corretamente de mais um espaço, ainda mais voltado para a Cultura.
Neste sábado, às 9h30, na sede da OAB será realizada a última (talvez) assembleia dos associados ao Taenca, para alguns ela servirá para concretizar o ‘sepultamento’ do grupo através de votação e seu retorno ao Poder Público, para outros será uma tentativa de continuar com a associação, através do apoio popular, e fazê-la retornar a atividade após quase 30 anos.