Uma Nova Economia por vir: “A Economia de Francisco”. Do que se trata?
A Terra é além de nossa casa comum, é chamada de Mãe por muitos povos. Mãe que cuida, que provê e acolhe
por Diogo Lopes*
Quero começar esse artigo citando um trecho da carta de convite do Papa Francisco para o evento que ele mesmo organizou junto com sua equipe para uma jornada que inicia-se formalmente em Março de 2020, em Assis na Itália, em busca de uma nova Economia:
“Escrevo para convidá-lo a participar de uma iniciativa muito próxima do meu coração. Um evento que me permitirá encontrar jovens, homens e mulheres, estudando economia e interessados em um tipo diferente de economia: um que traga vida, não morte, um que seja inclusivo e não exclusivo, humano e desumano, que cuide do meio ambiente e não o despoja. Um evento que ajudará a nos unir e permitir que nos encontremos e, eventualmente, participemos de uma “aliança” para mudar a economia de hoje e dar alma à economia de amanhã.”
Quando li essa carta, senti um chamado interno forte! Me identifiquei com a parte em que ele cita: “Certamente, é necessário “animar” a economia!”. E está claro, pelo primeiro trecho citado acima que essa palavra “animar” esta relacionada com “alma”. É preciso conectar a Economia com a “Alma”. E que Alma seria essa, que a Economia deixou de lado? Essa pergunta geradora me entusiasma muito! Para respondê-la, vou antes de arriscar-me a responder, usar novamente outra citação do Santo Padre, também da carta de convite ao evento de Assis.
“Na minha Carta Encíclica Laudato Si ‘, enfatizei que, hoje mais do que nunca, tudo está profundamente conectado e que a salvaguarda do meio ambiente não pode ser divorciada de garantir justiça aos pobres e encontrar respostas para os problemas estruturais da economia global. Precisamos corrigir modelos de crescimento incapazes de garantir o respeito ao meio ambiente, a abertura à vida, a preocupação com a família, a igualdade social, a dignidade dos trabalhadores e os direitos das gerações futuras. Infelizmente, poucos ouviram o apelo para reconhecer a gravidade dos problemas e, mais ainda, estabelecer um novo modelo econômico, fruto de uma cultura de comunhão baseada na fraternidade e na igualdade.”
Quero enumerar alguns da citação acima dos pontos de forma estruturada:
- Interdependência e Visão Sistêmica
- Justiça e Igualdade Social
- Correção e Soluções de Problemas Estruturais da Economia
- Respeito ao Meio Ambiente
- Preocupação com a Família
- Dignidade dos Trabalhadores
- Direitos das Gerações Futuras
- Escuta e Reconhecimento da Gravidade dos Problemas Atuais oriundos deste modelo Econômico vigente.
- Necessidade de emergir um novo Modelo Econômico baseado na fraternidade e na igualdade.
Voltando a nossa pergunta geradora: “É preciso conectar a Economia com a “Alma”. E que Alma seria essa, que a Economia deixou de lado? O próprio Papa, em sua carta convite ao evento cita a Encíclica: Louvado Seja! Cuidados com nossa Casa Comum, onde cita nove pontos inicialmente, sendo o primeiro o mais relevante para propor uma resposta.
Quando leio o Papa Francisco dizer em primeiro lugar o item “Interdependência” que eu associo a Visão Sistêmica, está claro para mim que ele está considerando que todas as formas de vida estão conectadas de alguma forma, sendo ainda, feita uma analogia muito interessante entre a Natureza Humana e Meio Ambiente.
Vejamos mais um trecho da Encíclica Laudato Si: item 155.
155. A ecologia humana implica também algo de muito profundo que é indispensável para se poder criar um ambiente mais dignificante: a relação necessária da vida do ser humano com a lei moral inscrita na sua própria natureza. Bento XVI dizia que existe uma «ecologia do homem», porque «também o homem possui uma natureza, que deve respeitar e não pode manipular como lhe apetece».[120] Nesta linha, é preciso reconhecer que o nosso corpo nos põe em relação directa com o meio ambiente e com os outros seres vivos. A aceitação do próprio corpo como dom de Deus é necessária para acolher e aceitar o mundo inteiro como dom do Pai e casa comum; pelo contrário, uma lógica de domínio sobre o próprio corpo transforma-se numa lógica, por vezes subtil, de domínio sobre a criação. Aprender a aceitar o próprio corpo, a cuidar dele e a respeitar os seus significados é essencial para uma verdadeira ecologia humana. Também é necessário ter apreço pelo próprio corpo na sua feminilidade ou masculinidade, para se poder reconhecer a si mesmo no encontro com o outro que é diferente. Assim, é possível aceitar com alegria o dom específico do outro ou da outra, obra de Deus criador, e enriquecer-se mutuamente. Portanto, não é salutar um comportamento que pretenda «cancelar a diferença sexual, porque já não sabe confrontar-se com ela».[121]
Conforme o trecho citado acima, ficou evidente para mim que o ponto de conexão entre o que chamamos de “Meio Ambiente” e os seres humanos é o próprio “corpo”. A palavra Humanidade, etimologicamente significa Terra: Humus. O corpo humano só é mantido e gerando, depois da fecundação graças a camada fértil do solo, que é capaz de fazer a semente germinar e dar os frutos. Quer dizer que podemos considerar que essa visão dicotômica entre Seres Humanos e Natureza é um ponto cego de nossa sociedade.
A conclusão que trago, neste primeiro artigo introdutório, relacionando a pergunta geradora que elencamos para investigarmos, por evidências, me fazem concluir que a Alma que necessitamos reencontrar na Economia é alma da nossa própria relação com a Terra.
Dentro das visões de mundo ancestrais – originárias, a Terra é além de nossa casa comum, apreciada e chamada de Mãe. Essa Mãe que cuida, que provê e acolhe. Com esse conceito os povos da florestas sabem que não existem recursos, mas sim vida. É certamente por essa visão de mundo que são conhecedores das fórmulas de interação que buscam integrar e harmonizar com seus territórios ao invés de explorar, sendo esta palavra, explorar, o significado etimológico da palavra consumo. Dentro de nossa chamada civilização, deixamos de praticar e apreciar as diversas visões de mundo que reconhecem essa conexão com esta “Alma”, para praticar e apreciar consumo visão e a globalização: ou seja, a redução das diversidades que busca desconectar essa “Alma”, ou esses valores.
A conclusão acima pode ser confirmada por meio do trecho abaixo da Encíclica:
145. Muitas formas de intensa exploração e degradação do meio ambiente podem esgotar não só os meios locais de subsistência, mas também os recursos sociais que consentiram um modo de viver que sustentou, durante longo tempo, uma identidade cultural e um sentido da existência e da convivência social. O desaparecimento duma cultura pode ser tanto ou mais grave do que o desaparecimento duma espécie animal ou vegetal. A imposição dum estilo hegemónico de vida ligado a um modo de produção pode ser tão nocivo como a alteração dos ecossistemas.
Dessa forma o que a Economia de Francisco, inspirada em São Francisco de Assis estará emergindo com esse chamado do Papa Francisco ao meu ver é um resgate da Sabedoria Ancestral combinada com um Futurismo integrativo, consciente e responsável.
No próximo artigo vamos continuar a navegar neste por vir! E você, como acredita que pode cooperar com esse chamado do Papa Francisco? Compartilhe e comente! Vamos dialogar e regenerar nosso pensamento, valores e nossa Casa Comum – Mãe Terra.
Fontes:
Site oficial do Evento:
https://francescoeconomy.org/
Carta Papa Francisco para Evento Economia de Francisco:
http://press.vatican.va/content/salastampa/it/bollettino/pubblico/2019/05/11/0399/00815.html#ing
Encíclica do Papa Francisco em Portugues
https://www.puc-campinas.edu.br/wp-content/uploads/2016/03/NFC-Carta-Enciclica-laudato-si.pdf
Série em Áudio e em Português da Encíclica Laudato Si:
https://redamazonica.org/pt-br/laudato-cuidado-nossa-casa-comum/
Diogo de Castro Lopes é botucatuense, empreendedor, e participará do evento A Economia de Francisco, em março de 2020- diogo@nascentes.org.br